Do Meu Folhetim https://domeufolhetim.blogfolha.uol.com.br Meias verdades sempre à meia luz Thu, 30 Sep 2021 12:29:11 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 Preocupada https://domeufolhetim.blogfolha.uol.com.br/2020/02/04/preocupada/ https://domeufolhetim.blogfolha.uol.com.br/2020/02/04/preocupada/#respond Tue, 04 Feb 2020 20:03:04 +0000 https://domeufolhetim.blogfolha.uol.com.br/files/2020/02/bial-320x213.jpg https://domeufolhetim.blogfolha.uol.com.br/?p=619 O coronavírus ainda não chegou, mas eu estou preocupada. Sem motivo para pânico, alerta o moço do telejornal, mas, quando troco de canal, e então quem fala é o apresentador grisalho, daí, diz ele, a encrenca não é só a enchente nas imagens ao vivo, porque a doença chinesa já é, sim, um baita problemão nosso, e que o ideal é todo mundo comprar correndo máscaras ainda hoje, ou então morreremos todos antes que um novo dia amanheça.

Caguei pro Datena. Não vou cair no frisson do momento. Tenho mais com que me preocupar, e é aquilo que eu já disse: eu estou bastante preocupada. Olha a Regina Duarte. Agora olha a Regina Duarte de novo. Sim, é a Helena de “Por Amor” abraçada no Bolsonaro. Como não ter medo de quem troca bebês, ainda mais para dar para a chata da personagem da Gabriela Duarte?

A Regina vai decidir tudo relacionado à cultura a partir de agora. Porque o Roberto Alvim gravou um vídeo nazista, e aparentemente só pode ser nazista se não aparecer na internet fazendo cosplay nazista. Fico em dúvida se ela vai se manifestar sobre o Pedro Bial se manifestando sobre a Petra Costa.

Li a entrevista logo pela manhã, e terminei preocupada. O mesmo cara que abre espaço no seu programa para mulheres denunciarem o João de Deus por assédio agora abre a boca para ser misógino. Talvez naquela época da denúncia contra o médium o Bial só quisesse audiência. Vai ver ele está passando vergonha agora pelo mesmo motivo.

O bom é lembrar que a opinião do Pedro Bial vai ser para sempre a mesma coisa: apenas a opinião do Pedro Bial. E, por mais preocupante que seja lembrar que homens com tamanha visibilidade ainda aproveitem sua relevância para falar groselha, a gente já aprendeu que valor de mulher nenhuma é definido pelo juízo masculino de quem quer que seja.

Junto com o medo de a Regina me botar naquela fotomontagem, minhas preocupações atuais vão além de vírus mundiais ou vermes nacionais. Quero saber se meu look de Carnaval vai ficar bom o suficiente pra eu me achar tão gostosa que me esqueça dos problemas por quatro dias.

Pulando quase pelada na rua, vai dar pra fingir que a gente não tem nada com que ficar noiado, que está tudo sob controle. A “ficção alucinante” de ser este um país onde a política almeja a cultura livre, sem lugar para censura ou sexismo. Porque, enquanto a realidade for diferente disso, preocupado é o mínimo que a gente precisa ficar.

 

]]>
0
O menino de dez anos que comanda o país https://domeufolhetim.blogfolha.uol.com.br/2019/03/06/o-menino-de-dez-anos-que-comanda-o-pais/ https://domeufolhetim.blogfolha.uol.com.br/2019/03/06/o-menino-de-dez-anos-que-comanda-o-pais/#respond Wed, 06 Mar 2019 19:00:01 +0000 https://domeufolhetim.blogfolha.uol.com.br/files/2019/03/bolsonaro-320x213.jpg https://domeufolhetim.blogfolha.uol.com.br/?p=361 A psicanálise deve explicar a mania que meu filho tem de se fazer de desentendido de vez em quando. A dinâmica é simples: eu peço algo a ele ou questiono um aspecto de seu comportamento, ele devolve com uma pergunta irritante, como se não fizesse ideia do que estou falando, e, nessa ignorância simulada, acaba conseguindo exatamente o oposto do que esperava – no lugar da simpatia, a minha mais profunda ira.

Ele tem dez anos. Freud, se vivo fosse, talvez defendesse que é justamente essa a época de se portar dessa maneira, que é mesmo a essa altura da infância que os meninos simulam ingenuidade para conquistar o afeto alheio, que deve ser fase passageira, que a gente se acalme e que tudo passa. Não precisa confiscar o PlayStation, moderaria Sigmund.

Acontece que tem coisas que nem a análise da psique humana explica, e há garotos que crescem adotando a mesma tática até a meia idade. Pagando de trouxa em busca de quem se identifique e solidarize.

A pergunta do presidente da República, por exemplo, postada em suas redes sociais, não tem nem um único caractere de ingenuidade. Sabe de nada, inocente, você que compra um tuíte daqueles como se o questionamento fosse real. Até onde sabemos, não há débitos da NET constando no endereço do Palácio da Alvorada, de modo que o Google funciona por lá tão bem quanto em qualquer outra casa com Wi-Fi no país.

Assim, digitar uma dúvida para 3.49 milhões de pessoas ao invés de consultar a maior enciclopédia anônima da internet não é sinal de inexperiência – pelo contrário, é atitude consciente e bem pensada. Feito os meninos de 10 anos, o presidente dissimula para despistar um erro, na expectativa de que a audiência perdoe a cagada de alguém tão incauto.

Lá em casa, esse tipo de comportamento não é aceito. Sempre que se repete, na melhor das hipóteses o moleque tem a atenção chamada. Na pior, perde o videogame e fica sem refrigerante uma semana. A cartilha da nossa família recomenda que cada um arque com as consequências dos seus tuítes e das suas escolhas.

Se preferiu postar um vídeo arbitrário tendo tantas outras opções à disposição, Jair Bolsonaro deveria, no mínimo, tocar o barco com outras pautas nos próximos posts, sem jamais fingir demência na tentativa de encobrir a imprudência. Optou, no entanto, pela tática dos garotos, e agora se vê às voltas com uma repercussão internacional vergonhosa e desagradável. Eu, no lugar da dona Olinda, suspendia o GTA Five e a Coca Cola Zero por um prazo indefinido.

]]>
0
Máscara de Fábio Assunção é o maior papelão do Carnaval https://domeufolhetim.blogfolha.uol.com.br/2019/03/05/mascara-de-fabio-assuncao-e-o-maior-papelao-do-carnaval/ https://domeufolhetim.blogfolha.uol.com.br/2019/03/05/mascara-de-fabio-assuncao-e-o-maior-papelao-do-carnaval/#respond Tue, 05 Mar 2019 22:37:34 +0000 https://domeufolhetim.blogfolha.uol.com.br/files/2019/03/fábio-assunção-320x213.jpg https://domeufolhetim.blogfolha.uol.com.br/?p=353 Enquanto eu como meu acarajé pós-bloco, o casal na mesa ao lado se diverte garfando uma moqueca e tirando da sacola as bugigangas que comprou para a folia. Confete, serpentina, tiara de flores para ela, e, para ele, uma máscara com o rosto barbudo do ator Fábio Assunção. Fábio, para quem passou o último ano em missão na Lua e não está sabendo, é dependente químico, e luta contra o problema falando abertamente sobre o assunto. Mas, nos blocos, virou o maluco que merece ser zoado em forma de fantasia de Carnaval.

O Fábio da máscara tem os cabelos muito claros, que até combinam bem com os brancos do cara da moqueca. Ainda assim, é grotesca a imagem de um homem por volta dos 60 anos que, ao prender no rosto um pedaço de papelão, embarca voluntariamente no deboche a uma doença séria. Como se rir das falhas dos outros fosse importante para a diversão.

Infelizmente, o senhor de máscara não está sozinho na galhofa. Nesta semana de Carnaval, os blocos de São Paulo estiveram apinhados de ambulantes vendendo o adereço, como eu mesma presenciei, e os comércios populares do Brasil todo, contam os jornais, também faturam com as vendas da impressão da cara doente de Fábio, com os olhos furados e um elástico preso de uma ponta à outra. Compram a fantasia: velhotes ridículos fãs de moqueca, moças de flor na cabeça, rapazes suados sem camisa.

Nenhum estudo demográfico foi realizado, ainda, para definir quem é o cliente médio deste tipo de negócio que perverte coisa grave em piada, e, por isso, fica para mim a dúvida de como seria a reação deste desconhecido freguês/freguesa se, pendurados no mostruário do camelô, também estivessem outros modelos infames de máscara.

A saber, por exemplo: uma com a cara do seu pai desempregado e deprimido, que já há dois anos toma Prozac tentando ajustar a vida, mas não consegue sequer sair da cama de manhã. Ou da sua melhor amiga, que, em um relacionamento sério há quase uma década, sabe que vive um namoro abusivo, mas não tem recursos emocionais para sair dele. Máscara da sua mãe alcoólatra, e uma do seu amigo que fuma maconha o dia inteiro todos os dias e até gostaria de ter uma vida mais solar, mas não está conseguindo.

No Instagram, Fábio até garantiu que entendia a zoeira, embora não endossasse, de maneira nenhuma, a glamourização da sua dor. Por causa desse posicionamento, antes de começar a folia tentamos, aqui na Folha, entrevistá-lo para falar sobre o assunto, mas, dada a repercussão de tudo, o ator, via sua assessoria de imprensa, explicou que, no momento, prefere ficar em silêncio.

Compreensível. Eu, que já vivi uma série de relacionamentos abusivos, incluindo um de nove anos do qual custei a ter forças para sair, talvez também optasse por me calar caso meu rosto covarde e abatido de adicta ao amor doente estampasse qualquer tipo de gozação nacional. É um silêncio que obviamente passa pela vergonha da própria fragilidade, mas também pela decisão de não compactuar com a mania de ver os transtornos mentais como doenças menores.

Dependência não tem graça. Quem converteu um vício em máscara – e sobretudo quem a vestiu – merece 10 no quesito de maior papelão desse Carnaval.

 

 

 

]]>
0
Bruna Marquezine e a fantasia de mulher evoluída https://domeufolhetim.blogfolha.uol.com.br/2018/02/14/bruna-marquezine-e-a-fantasia-de-mulher-evoluida/ https://domeufolhetim.blogfolha.uol.com.br/2018/02/14/bruna-marquezine-e-a-fantasia-de-mulher-evoluida/#respond Wed, 14 Feb 2018 12:59:15 +0000 https://domeufolhetim.blogfolha.uol.com.br/files/2018/02/bruna15182767825a7f10ae336e8_1518276782_3x2_xl-150x150.jpg http://domeufolhetim.blogfolha.uol.com.br/?p=134 É o peito da Bruna Marquezine, é o decote da Cleo Pires, é a bunda da anônima que entra na padaria pra comprar água e voltar pra folia – passou o bloco da patrulha. Não sei no Facebook de vocês, mas, no meu, só tem puritano perfeito nesse Carnaval. Quer dizer, justiça seja feita: perfeito, não, só perfeita mesmo.

Porque parece que não ter silicone é caído. E que expor seu silicone também é errado. Calcinha muito pequena não pode, maiô socado também não. E nem pense em aparentar felicidade, principalmente se estiver seminua, porque pega mal e ofende as famílias. Senhor. E a gente achando que era só se vestir de índio e cigana que dava B.O nesse fevereiro de 2018.

E olha que, se fosse só homem dizendo que os peitinhos da Bruna estão fora do padrão ISO 9000 brasileiro de qualidade, eu não me espantaria – afinal, não é de hoje que a gente tem que portar o que mais agrada à freguesia, e não a nós mesmas. Mas o que pegou foi que, de 10 sommeliers de teta que passaram pela minha timeline (e pela sua, creio), 23 eram mulheres.

Gente, quem são vocês que replicam cobranças que nos vomitaram na cabeça pela vida toda? Por que fazer com as outras o que você odeia que te façam? Você não percebe, moça, que está sendo machista?

A colega se queixa de que estava na padaria com o marido, filho e sogro mandando ver num pão na chapa quando uma mulher contente posicionou sua meia bunda de fora na fila do caixa. Cadê as viaturas quando a gente mais precisa delas, bradava a mãe de Jesus no post em um grupo composto só de mulheres. Acode, Rota, pelo amor!

E a gente não pode nem reclamar dessas vagabundas (sic) em paz, clama a mulher que, ontem mesmo, estava lá compartilhando com a gente a foto dum cara equilibrando uma toalha no membro em riste (salvei aqui, se quiserem eu mando). A indignada original, que topou com a animada nádega na padaria, frisou, por fim, que, além de tudo, ainda tinha que lidar com o marido e o sogro ofendidos com a nudez alheia – porque se tem uma coisa que eles realmente devem ter ficado ao ver a foliã pelada foi chateados, aposto.

Amiga, não adianta camuflar sua insegurança debaixo de uma suposta moral rigorosa e depois vir esfregar no nariz da gente. Não cola. A tentativa de controlar o universo à sua volta – e a consequente decepção ao ver que isso é impossível – só te aprisiona e entristece. E se a gente te contar que é tão mais fácil se libertar e entrar no jogo?

Não quer arrancar fora a roupa, não arranca. Não quer dançar no bloco, não dança. Não gosta de peito e bunda de fora, não olha. Mas não nos venha com a sua honra tentar cercear a nossa autonomia. Que aí, perdoe, a vontade geral será rebolar definitivo todo o atrevimento de uma geração emancipada no cappuccino da sua família de bem.

Não aceitar o corpo da outra é sinal de que está difícil aceitar o seu. E isso, saiba, muito provavelmente nem é culpa sua, mas, sim, dos padrões nos quais somos todas obrigadas a nos encaixar desde pequenas. Vale, portanto, tentar identificar realmente o que te move ao malhar os seios alheios – ciúmes, inveja, baixa autoestima – e curar a ferida que há no seu próprio peito.

Faça as pazes com você mesma e experimente, então, olhar de novo para toda a ousadia do Carnaval. Garanto que nada cai melhor na gente do vestir com propriedade a fantasia de mulher evoluída.

 

]]>
0
Sonda é tendência para a próxima estação https://domeufolhetim.blogfolha.uol.com.br/2017/10/30/sonda-e-tendencia-para-a-proxima-estacao/ https://domeufolhetim.blogfolha.uol.com.br/2017/10/30/sonda-e-tendencia-para-a-proxima-estacao/#respond Mon, 30 Oct 2017 20:43:50 +0000 https://domeufolhetim.blogfolha.uol.com.br/files/2017/10/Danilo-Verpa-Folhapress-180x87.jpeg http://domeufolhetim.blogfolha.uol.com.br/?p=90 Eu poderia estar correndo, eu poderia estar dançando, eu poderia estar dando um duplo twist carpado mortal para trás com cobertura extra de chantilly, mas estou só com um cano enfiado na uretra por decisão médica depois que minha bexiga parou de funcionar por conta própria. Longa história. Uns dias no hospital, cirurgia, morfina, a tão sonhada alta, e a escrota da sonda veio embora junto para casa.

De longe, meu adendo passa por uma bolsa de mão. Daqueles modelos de plástico, um tanto cafonas, sim, porque transparente, e deixaria ver, em situações normais, seu conteúdo clássico – uma carteira, celular, documentos, caneta, talvez um bombom. Mas, na minha bolseta de alça, não, nela só uma coisa fica à vista: meu xixi. Límpido, amarelo lusco-fusco, saudável, até, mas, né, mijo, ainda. Meio eca.

A enfermeira gentil ofereceu, na saída da internação, uma sacola plástica com o logotipo do hospital e sugeriu “Guarda dentro, boba”, o que também já despertou nos parentes presentes ideias de criativos invólucros para disfarçar o transporte da sonda por onde me for necessário ir nos próximos meses. Uma tia imaginou uma trouxinha de tricô com ponto reforçado, a outra, uma daquelas roupas como as de botijão de gás ou filtro d’água, mas, agora, numa versão diminuta para esconder apenas o xixi que ninguém quer ver.

Agradeci muito, têm todos sido tão gentis comigo, mas expliquei que, no que depender de mim, a sonda permanecerá assim, como veio ao mundo. Nua, explícita, esfregando na cara da sociedade toda sua função coletora e medicinal. Se não escolhi que me introduzissem um tubo nas partes pudendas, que se acostumem todos com o desfile da bolsa. Vai ter sonda, sim, e, se reclamar, vai ter sonda cheia de 2 mil mililitros.

E que se use essa oportunidade para reconhecer e quiçá louvar, até, não apenas a necessidade da sonda, mas também sua profunda utilidade nas mais diversas situações. Se o mundo se despisse dos preconceitos e se abrisse para o novo, lá estaria a sonda como acessório em shows de rock daqueles superlotados.

A fim de não perder o lugar na fila do gargarejo apenas por conta de uma inconveniente micção, os fãs portariam, felizes, suas sondas anexas à coxa, junto com o celular, o documento e o ingresso – as mãos estariam livres para os inúmeros copos de cerveja que se desejasse, afinal, ninguém tem que sair no meio daquela música boa só para se aliviar e fazer xixi.

Vejo, ademais, imensa oportunidade de uso de nossa colega plástica agora, em tempos de Enem. Lápis grafite número 2, borracha, identidade e garrafa d’água, e resolve-se o problema das fraudes e colas de estudantes que vão ao banheiro. Pode ter sonda no réveillon de Copacabana, pode ter sonda na descida para o litoral em véspera de feriado, sonda no Carnaval na Vila Madalena e sonda na fila da vacinação contra febre amarela.

À minha já me apeguei num tanto que ai de ginecologista que venha com conversa de voltar a usar a bexiga normalmente. Bora de sonda customizada de Yves Saint Laurent na reunião de trabalho, e com glitter e estampa de sereia na balada de amanhã à noite.

Não dou dois meses para a sonda surgir no próximo catálogo da Farm, e para chover tutorial de sonda em forma de donut em mil canais do Youtube. Não está aí Michel Temer aderindo à moda, para não me deixar mentir? Pois é essa a tendência do verão vindouro, meninas: cateter na uretra e bom-humor ante a própria desgraça. Confiem e mim e arrasem.

]]>
0