Do Meu Folhetim https://domeufolhetim.blogfolha.uol.com.br Meias verdades sempre à meia luz Thu, 30 Sep 2021 12:29:11 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 Poema do amor voraz https://domeufolhetim.blogfolha.uol.com.br/2019/04/22/poema-do-amor-voraz/ https://domeufolhetim.blogfolha.uol.com.br/2019/04/22/poema-do-amor-voraz/#respond Mon, 22 Apr 2019 13:53:06 +0000 https://domeufolhetim.blogfolha.uol.com.br/files/2019/04/milhases-320x213.jpeg https://domeufolhetim.blogfolha.uol.com.br/?p=389  

Os males do amor,

muitos e variados,

desde o tipo rejeitado até

o iludido,

encobrem aquele que, de todos,

é o mais doído –

porque à vítima impõe

da miséria a pungente angústia -,

ficando omitido,

até que, abatido

um novo amante, lembra-se,

a humanidade,

da força de tal moléstia.

 

Quando o sentir não basta

(ainda que farto)

porque no peito sobra espaço,

não chegam beijos

nem evidências,

não faz diferença

a constância.

Reluz só

a carência,

brilham os vãos, e grita

a fome:

é o amor voraz, quando o desejo

nunca chega, e faz querer

 

tatuar seu nome

do seu inteiro tirar um pedaço,

arrancar-te e mordiscar um dedo,

para, depois, dependurado,

exibi-lo numa corrente.

 

Esganado o peito em vazio frequente

sonhar em, com a língua,

te esfolar, inteiro,

e fazer da pele toda goma

de mascar.

 

Teu cheiro:

num frasco ao alcance

da mão, no bolso,

chuviscado no pulso, romance

em gotas de suor azedo.

 

O que te há de belo,

o que te sobra, impuro.

Não tem critério o amor voraz,

porque anseia seus excertos

duros

inseridos no meu contexto.

Será que é um filho

que, teu, cresça

me ocupando,

ou só mesmo

sua carne, inchada,

me recheando?

Engolir você: a meta.

 

]]>
0
Aos meus homens, um feliz Dia do Professor https://domeufolhetim.blogfolha.uol.com.br/2018/10/15/aos-meus-homens-um-feliz-dia-do-professor/ https://domeufolhetim.blogfolha.uol.com.br/2018/10/15/aos-meus-homens-um-feliz-dia-do-professor/#respond Mon, 15 Oct 2018 20:25:30 +0000 https://domeufolhetim.blogfolha.uol.com.br/files/2018/10/reader-320x213.jpg https://domeufolhetim.blogfolha.uol.com.br/?p=283 Todo domingo de manhã, depois da Fórmula 1, rolava a vitrola lá em casa, e o hit mais pedido na parada era a poética “Deixa Eu te Amar”. Cresci cantando Agepê, sabendo o pódio de cada grande prêmio, e sempre por dentro da escalada das novelas das seis, das sete e das oito. Uma verdadeira surra de sabedoria semanal.

Sou filha de jornalistas, gente que escreve direito, mas leitura, por exemplo, era um quesito deficitário na família. As edições da imprensa do dia forravam, à noite, o chão das gaiolas dos canarinhos que meu pai colecionava, e alguns poucos livros enfeitavam a estante da sala junto com a vitrola. Na paralela, eu devorava gibis e livros infantis que serviam mais para me distrair do que educar, e nada que tivesse passado por um crivo da ABL na hora da compra na livraria.

Eu era, portanto, um prato cheio para a mediocridade cultural. Sem instrução nem referência, inclusive na escola rasa e amarrada ao currículo básico, passaria a vida sem saber que havia vida além da obrigação de ler Luís de Camões. A sorte foi que os mestres me salvaram, cruzando meu caminho com seus discos, seus livros e muito, mas muito mais.

Eles não eram educadores. Ao menos não oficialmente. Eram jornalistas, músicos, atores, escritores, e me transformaram na mulher que sou ao me ensinar tudo que sei sobre canções, livros e filmes, e também ao construir junto comigo toda a minha cultura sexual. Meus homens foram meus professores.

Eu não tinha nem 20 anos e deitava no tapete da casa de um deles ouvindo Cartola, Edu Lobo, Tom Jobim, enquanto era beijada e ditada a lição de casa. Com outro, o programa era me enroscar nos lençóis brancos da cama de frente para a jabuticabeira do quintal e escutar Thelonious Monk e John Coltrane – na saída, levava na bolsa as resenhas do Camus que deveria estudar para a chamada oral da semana seguinte.

Enquanto amei um veterano, assistia pelada Monty Phyton, para aprender os caminhos do humor sarcástico, e houve um que, por um inverno inteiro, e também sem roupa, me deitava no seu peito e lia poesia. A cada estrofe, um beijo molhado, e, quando findo um livro inteiro, nos esquentávamos um em cima do outro.

Que saudade, queridos mestres, de todos vocês e das nossas aulas. Na nostalgia de hoje, quando se comemora seu dia, repassei cada um dos nossos anos letivos e o quanto – acho – sempre me formei com extremo louvor. Vocês ainda se lembram de mim, será? Cogitemos um reencontro de formandos algum dia desses, quem sabe, queria saber como vocês andam.

 

]]>
0
Gol contra é tendência na Copa e na vida https://domeufolhetim.blogfolha.uol.com.br/2018/06/21/gol-contra-e-tendencia-na-copa-e-na-vida/ https://domeufolhetim.blogfolha.uol.com.br/2018/06/21/gol-contra-e-tendencia-na-copa-e-na-vida/#respond Thu, 21 Jun 2018 11:00:29 +0000 https://domeufolhetim.blogfolha.uol.com.br/files/2018/06/polônia-320x213.jpg http://domeufolhetim.blogfolha.uol.com.br/?p=202 “Não tem justificatiiiivaaaaa”, se esgoela, todo desalmado, o comentarista na TV. E isso que o único pecado do jogador era ter marcado um gol contra, coitado, imagina se ele fizesse algo muito horrível tipo escrotizar mulheres russas de maneira misógina e criminosa no meio da rua (ainda bem que na vida real ninguém ousa nada disso, ufa).

Acho cruel e injusto esse peso todo que se coloca sobre quem marca ponto sem querer nos próprios amiguinhos. São atletas que ganham milhões para jogar futebol? Sim. Que ocupam um lugar que todo mundo queria? Também. Mas, poxa, sejamos honestos, quem nunca cometeu um golaço contra si mesmo nessa dura dessa vida?

O gol contra nada mais é do que aquele momento em que você pensa “ok, eu sou mesmo um bosta, tomara que eu morra”, e isso seja qual for a circunstância do deslize. Ainda que não se trabalhe batendo bola, por exemplo, tem gol contra no escritório – existe humilhação maior que dar prejuízo à própria empresa ou ajudar um concorrente?

Tem gol contra na política, quando se cai no conto de que primeiro a gente tira uma e depois a gente tira o resto. Gol contra no amor, se o resultado do tão aguardado ménage é sua mulher apaixonada pela mina que você escolheu para transar – do cara com a taça na mão, você, passa, agora, para o divorciado vacilão.

Nada na vida é mais humano que o auto-gol. Somos todos o pobre curitibano-polonês enfiando devagarinho a bola no travessão do país que o acolheu como cidadão. Tamo junto, com as mãos na cabeça, #chateados, tomando do goleiro um tapinha de consolo na bunda.

Foi o quinto gol contra na Copa da Rússia. Estamos, com isso, à beira de bater o recorde da Copa da França, em 1998, quando seis jogadores presentearam suas seleções com uma bola inimiga. Finalizemos o campeonato com qualquer total, o importante é mantermos em mente o fato de que gol contra não é tendência apenas na Copa, mas, sim, uma moda para a vida. Uma prática involuntária, ok, mas algo a ser acolhido e superado. Um negócio que dá e que tem que passar, sem maiores encanações.

Ontem recebi um boy em casa. Não sei se rolou pé alto ou convulsão no vestiário, mas a questão é que, com 90 minutos de jogo, o sexo não saiu. Estava tudo bem, quando, de cueca nos joelhos e olhar cabisbaixo, ele admitiu, sim, o placar adverso, mas culpou a equipe toda pela própria broxada. Chutão para trás, bola entrando, e olha outro gol contra na Copa – e, nesse cenário arrogante, diz o Arnaldo, não há outra alternativa a não ser puxar o cartão.

 

]]>
0
Dia dos Namorados e o presente de um perfil sincero https://domeufolhetim.blogfolha.uol.com.br/2018/06/12/dia-dos-namorados-e-o-presente-de-um-perfil-sincero/ https://domeufolhetim.blogfolha.uol.com.br/2018/06/12/dia-dos-namorados-e-o-presente-de-um-perfil-sincero/#respond Tue, 12 Jun 2018 15:59:12 +0000 https://domeufolhetim.blogfolha.uol.com.br/files/2018/06/orelhão-320x213.jpg http://domeufolhetim.blogfolha.uol.com.br/?p=195 Vem ano e vai ano e ninguém toma a coragem de cancelar o Dia dos Namorados. Cadê o Temer quando a gente precisa? Por uma causa dessas os caminhoneiros não param?

É sempre a mesma ladainha. Quem tá em um relacionamento fica se esforçando para dar um presente bosta para a cara-metade, pagando perfume em crediário, chocolate superfaturado, bicho de pelúcia pra encher de poeira na cama, enquanto quem tá solteiro sofre, achando que tá perdendo grandes coisas por não receber um cartão virtual ou um textão com foto no Facebook.

Ninguém fica feliz, basicamente (tirando o dono da Giuliana Flores e do Motel Colonial Palace, mas, enfim, só eles mesmo). E vira meio Copa do Mundo, um grupo contra o outro no Facebook, ah, eu tenho alguém que me coma, segura essa relação estável, você tá aí sozinho, melhor mesmo é amor próprio, antes assim do que com namorada lixo. Preguiça.

A gente simplesmente não sabe se relacionar. Fim.

Quem sou eu na fila da Fluoxetina para falar de psicanálise, mas acredito que um dos grandes problemas dos namoros e casamentos está no fato de que a gente, na ânsia de agradar e ser amado, finge que é alguém diferente, enquanto o outro finge que é outrem, e ficamos os dois ali transando e tentando encontrar a felicidade – que, nesse formato, sorry to say, nunca vai chegar.

No mundo ideal, a gente se apresentaria aos crushes da forma que de fato é. Com os buracos, defeitos, desejos, taras estranhas. Manja anúncio de orelhão? Natália gostosa engole tudo etc? Ou perfil de aplicativo de relacionamento, quando todo mundo mete aquela foto naturalíssima e um resumo mentiroso do seu jeitinho estranho de ser? Imagina se fossem sincerões os perfis.

FABRÍCIO. Moreno, olhos claros. Me acho melhor na cama do que realmente sou. Te ignoro no dia seguinte e pergunto no chat quem é aquela sua amiga gata do Facebook.

JACQUELINE. Baixa autoestima, insegura, me apaixono por todo mundo com quem saio. Durmo com você hoje e amanhã já jogo seu nome no tarô online para saber se você me ama.

DÉBORA. Gata, bem-sucedida, tenho três prêmios internacionais e quatro apartamentos em Pinheiros. Pareço resolvida, mas, já no terceiro encontro, aproveito para fuçar seu celular enquanto você vai ao meu lavabo de mármore.

ANDRÉ. Levo você para comer sushi e conhecer minha mãe. Mês que vem te chamo de vaca.

LETÍCIA. Corpo violão, voz de soprano, preparo um risoto de comer de joelho. Do mesmo jeito que traí meu namorado para dar para você, vou te botar chifre quando pegar seu melhor amigo.

RENATO. Curto crossfit, te convido para treinar junto, vamos rachar um whey no parque. Mas só de segunda a quinta, porque de sexta a domingo eu fico com minha namorada oficial.

PEDRO. Alto. Executivo. Pago assinatura premium do xvideos.

Pois é isso, a vida, uma eterna busca por um match perfeito, ainda que a gente saiba que isso não existe. Um sofrimento para se encaixar nos padrões, para não ser diferente, sendo que todo mundo no mundo é diferente um do outro. Ah, o “serumano”.

De modo que, se posso dar um único conselho nesta terça-feira de sol é o de que todo mundo tenha um feliz Dia dos Namorados, seja solo, seja acompanhado, porque o que importa no 12 de junho (e no 13, e no 21 de agosto, no 9 de outubro, janeiro, fevereiro, 16 de abril, 14 de maio) é a gente gozar e ser feliz. A idealização do amor verdadeiro e eterno, ah, essa a gente resolve depois.

Siga o blog no Facebook e no Instagram @domeufolhetim

]]>
0
Sabe quem também gosta de transar? A sua mulher https://domeufolhetim.blogfolha.uol.com.br/2018/05/18/sabe-quem-tambem-gosta-de-transar-a-sua-mulher/ https://domeufolhetim.blogfolha.uol.com.br/2018/05/18/sabe-quem-tambem-gosta-de-transar-a-sua-mulher/#respond Fri, 18 May 2018 22:52:49 +0000 https://domeufolhetim.blogfolha.uol.com.br/files/2018/05/sexo-320x213.jpg http://domeufolhetim.blogfolha.uol.com.br/?p=176 Tá vendo essa pessoa aí do seu lado no sofá, de perna para o alto, meia grossa e cara de sono? Pois eu tenho uma revelação a te fazer: ela gosta bastante de transar. E não adianta vir com a conversa de que do seu marido ou da sua mulher quem sabe melhor é você, e que é óbvio que o Antônio Carlos ou a Neide já há anos que não tem libido, porque esta coluna, hoje, vem trazendo grandes verdades.

À parte a psicanálise, à qual sou bastante afeita, porém dela muitíssimo ignorante, é senso comum que, em relacionamentos longos, os parceiros se dessexualizem mutuamente, esquecendo que, dentro daquele pijama de flanela, bate um coração e latejam xoxotas e paus. É como se, ao olhar para o ser amado, só sobrasse a imagem que se tem dele no cenário da vida doméstica e da rotina da relação.

Desaprende-se, por exemplo, que aquela figura foi, um dia, a pessoa que trocava mensagens safadas de madrugada, produzia nudes de qualidade, e levava gente para a cama, tudo para ficar pelado e, feliz, apresentar o repertório ao respeitável público (do qual, leitorx, você também obviamente que fazia parte).

Eu realmente não sei por que motivo, além do evidente cotidiano matador, a gente faz isso com as relações. Por que diabos arrancamos do outro todo o caráter sexual que um dia tanto nos encantou. Talvez seja para sobreviver ao pânico irracional de perder quem tanto se ama, de modo que, fingindo cegueira, sublima-se todos os aspectos dele que poderiam ser interessantes aos possíveis rivais.

Aspectos, estes, que foram justamente o quê, no passado, nos atraiu a sair para beber com aquela criatura, der uns beijos nela, transar com ela três vezes, depois transar outras dez, depois comer uma pizza e ver cinco séries, tudo em uma linda escalada que culmina com o sofá de agora, perna para o alto, meia grossa, cara de sono.

É justamente por esquecer que a mulher ou o marido continuam gostando de flertar como antigamente – e que, como qualquer adulto saudável, gosta de se sentir desejado e suspira pela quase sempre utópica perspectiva de um dia poder transar com outra pessoa sem ser considerado um adúltero criminoso digno de pena de morte – que muita gente se surpreende ao entrar em contato com essa porção sexual do parceiro, seja ao flagrar um inocente momento de prazer solo, ou ao rever aquele ser erótico de volta à ativa após um rompimento.

Que legal seria se evocássemos com mais frequência esses seres transantes que tanto nos encantaram no passado, e a quem escolhemos para compartir a vida. Que mantivéssemos em mente o quanto eles são fascinantes, sensuais, libidinosos. E isso não só com o objetivo paulocoelhístico de valorizar e reconhecer o companheiro, mas, também, em benefício próprio. Afinal, ao lembrar que tesão antigo não arrefece, fica mais fácil distinguir a sedução (e a ereção) por baixo da calça de moletom.

 

]]>
0
Meu filho quer saber o que é uma camisinha: e agora? https://domeufolhetim.blogfolha.uol.com.br/2017/11/09/meu-filho-quer-saber-o-que-e-uma-camisinha-e-agora/ https://domeufolhetim.blogfolha.uol.com.br/2017/11/09/meu-filho-quer-saber-o-que-e-uma-camisinha-e-agora/#respond Thu, 09 Nov 2017 10:26:23 +0000 https://domeufolhetim.blogfolha.uol.com.br/files/2017/11/camisinha-180x98.jpeg http://domeufolhetim.blogfolha.uol.com.br/?p=93 Bala de menta, bala de cereja, bala na latinha, no saquinho, bala, bala, bala e, hum, o que é esse pacotinho? A caixa oferece nota fiscal paulista, pede CPF, enche a cliente de perguntas, e, em meio ao caos que é sempre o momento do pagamento de uma compra na farmácia, digite sua senha, por favor, senhora, a mãozinha se ergue entre o cartão, a máquina e a paz que a ignorância até então trazia à relação de avó e neto.

– O que é isso aqui?

E, balançando o pacote de camisinhas com três unidades, meu filho interpela minha mãe, uma mulher de 65 anos, assim, à queima-roupa, despreparada e leiga de quão profundamente o assunto sexo já havia sido abordado em casa. A farmácia, lotada, ri. Minha mãe só quer chorar.

– Espera que eu já te explico.

– Ué, explica agora, o que é isso? Me diz.

– Só um minuto, menino, calma.

A cliente seguinte na fila imensa e agora entretida pelo espetáculo inesperado assegura “Isso só acontece quando eles estão com as avós”, algo entre o consolo e o escárnio, e minha mãe, avó do neto único, cogita sair correndo e desaparecer em algum lugar entre a Finlândia e o Polo Sul.

Larga isso, põe de volta onde você achou (ele achou ao lado da sessão de balas, como eu dizia, e fica aqui a reflexão a respeito do sadismo dos funcionários das drogarias que devem ficar aguardando por ocorrências como esta ao longo de todo o dia, única diversão entre uma receita de Prozac e algumas dúvidas sobre a dipirona), vamos embora que, em casa, sua mãe te explica.

A mãe sou eu.

E sexo é assunto que, aos poucos, já vinha sendo debatido com as crianças – são duas da mesma idade, beirando os dez -, de modo que algumas etapas do processo no qual uma camisinha se inseriria ainda estavam frescas na cabeça do garoto, especialmente porque, ao ouvi-las, lançou um “que nojo!”, e isso não é coisa que se esqueça facilmente.

Em resumo, aproveitou-se uma camisinha que havia aqui em casa, porque o conteúdo visual me parece eficiente para qualquer tipo de palestra, e tudo correu de maneira tão natural que os funcionários da farmácia ficariam todos mais do que chocados.

Ninguém está aqui para ditar regras sobre criação dos filhos, nem sou eu uma expert porque, olha meu currículo cheio de falhas, mas acredito, do alto de minha fictícia formação em psicologia, que educação sexual é algo deve começar em casa, sem constrangimentos nem enrolação.

Se sexo é uma parte tão importante e real da vida, que se aprenda o que for possível dentro de casa, em um ambiente cercado de amor, onde a primeira impressão – seja ela real ou ilusória, não importa – seja de que transar com alguém, com consentimento, é algo saudável, gostoso e doce, exatamente como uma bala de cereja na estante da farmácia.

 

]]>
0
Segredo do casamento é valorizar o outro em meio ao caos https://domeufolhetim.blogfolha.uol.com.br/2017/10/04/segredo-do-casamento-e-valorizar-o-outro-em-meio-ao-caos/ https://domeufolhetim.blogfolha.uol.com.br/2017/10/04/segredo-do-casamento-e-valorizar-o-outro-em-meio-ao-caos/#respond Wed, 04 Oct 2017 18:19:26 +0000 https://domeufolhetim.blogfolha.uol.com.br/files/2017/10/Fotolia_172714804_Subscription_Monthly_M-180x120.jpg http://domeufolhetim.blogfolha.uol.com.br/?p=62 Namoro é um negócio tão legal, mas tão legal, que a gente não tolera que algo tão legal esteja acontecendo com a nossa vida, e, então, a gente vai lá e destrói o namoro. E como é que a gente destrói o namoro? Transformando-o em casamento. E, na verdade nem precisa casar de verdade para destruir o namoro, envolver as famílias, a Justiça, Deus – não, só precisa mesmo é ir morar junto e dividir o mesmo espaço. A tal união das escovas de dentes tem poder explosivo igual ou maior que o da certidão lavrada em cartório.

A ver: agora a gente vai brigar não só por aquelas coisas todas que a gente já brigava. Agora, a gente vai brigar também por mais um montão de coisas novas, sendo algumas delas coisas que a gente nem sabia que existiam, que dirá que dava para brigar sobre. Mal posso esperar. Vai ter discussão por causa da louça suja. Da lista de mercado. Do rolo de papel higiênico para frente ou para trás.

A gente vai se controlar bem mais, também. Não só o controle daquelas coisas que todo casal tem ciúme, tipo saídas com os amigos com voltas no dia seguinte, ou o celular que não para de apitar com mensagens chegando em todos os aplicativos possíveis. Essas já são de praxe. Agora, a nova modalidade de ciúme vai ser sobre o tempo passado em frente à TV sem inclusão do parceiro. Ou mesmo o inédito controle sobre o tempo do banho ou do cocô alheios. Como se a TV, a privada ou o chuveiro fossem assustadoras ameaças à ordem e à felicidade de um relacionamento.

O problema maior do morar em uma mesma casa é que, com toda uma carta de assuntos para se bater boca novinha em folha à disposição, é uma tentação ao casal deixar de prestar atenção nas coisas divertidas. Se ficarem de muita picuinha, deixarão de ver que aqueles momentos pelos quais costumavam ter que esperar a semana inteirinha para acontecer agora estão ali, à disposição, para serem vividos todos os dias. Dividindo o mesmo teto, toda noite é noite de maratona Netflix. Qualquer hora é hora de campeonato de quem faz o outro ter mais orgasmos.

Ninguém está dizendo que vai ser fácil o tempo todo. Fora os desentendimentos, tem-se os outros pequenos ônus da convivência diária com um ser diferente (e talvez não tão evoluído quanto) de você. As escatologias, por exemplo. Quem já dormiu comigo, vestido ou pelado, sabe que sou uma pessoa que tem gases – e este é um assunto tabu em qualquer casamento, sejamos honestos. É praticamente o Voldemort da vida conjugal, aquele-de-quem-não-falamos-o-nome.

Tenho a sorte de que, desde que fui habitar o mesmo espaço que minha alma gêmea, vim parar em um bairro onde aviões passam voando muito baixo. O que, por um lado, atrapalha o sono de maneira impensável, por outro facilita o alívio e o desconforto intestinais de maneira praticamente incógnita. Aqui em Moema, a gente aproveita os pousos e as decolagens a cada três minutos para, sempre que se faz necessário, mixar o som de um pum com o do Airbus na janela. Só vi vantagens.

A perda de privacidade também pode ser outro ponto de tensão entre noivo e noiva, afinal, quem é que um dia sonhou com este momento, em que é preciso depender da agenda do outro para realizar tarefas tão mundanas quanto cortar as unhas do pé, escutar sertanejo ou mesmo se masturbar em frente ao computador? “Olha, amor, como eu sou legal, marquei para você esse curso de uma semana no interior, enquanto eu prometo ficar aqui morrendo de saudade”. Sorriso escroto, risada maligna.

Morar junto é tão desafiador que, ao invés de balde de gelo e abridor de vinho, as pessoas deveriam dar de presente ao novo casal alguns itens muito mais úteis no dia a dia, tipo: incentivo, serenidade, maturidade. Porque não há nada tão gostoso e trabalhoso ao mesmo tempo em todo o mundo. Por trás de uma fechadura em comum, é necessário expandir e estreitar o foco, simultaneamente – primeiro, para que a relação não se perca em discordâncias miúdas, e, segundo, para que não se mate o amor maior, perdido diante de um cotidiano tão vasto.

O segredo do casamento talvez esteja em valorizar tudo aquilo que no outro nos satisfaz, e que também nos enlouquece. Na alegria, na tristeza, no caos, no dia de faxina. É ir deitar, constantemente e lado a lado, e analisar as horas vividas como um bônus perto de quem deliberadamente escolhemos, sendo que havia tantas outras opções à disposição. É sentir-se, vez ou outra, apavorado, com profundo medo de perder aquela pessoa, porque não existiria, em todo mundo, ninguém com quem morar junto funcionaria tão bem.

 

 

]]>
0
Precisamos falar sobre a endometriose https://domeufolhetim.blogfolha.uol.com.br/2017/09/25/precisamos-falar-sobre-a-endometriose/ https://domeufolhetim.blogfolha.uol.com.br/2017/09/25/precisamos-falar-sobre-a-endometriose/#respond Mon, 25 Sep 2017 14:26:36 +0000 https://domeufolhetim.blogfolha.uol.com.br/files/2017/09/IMG_20170925_094059_208-vale2-180x120.jpg http://domeufolhetim.blogfolha.uol.com.br/?p=52 Um analgésico, um anti-inflamatório, um anticoncepcional, um antigases, um antiespasmódico. A rotina de cinco comprimidos anti alguma coisa se repete quatro vezes no meu dia, já há alguns meses. A luta contra minha doença começou em janeiro passado, mas, a convivência com ela, sem que eu soubesse de que se tratava, data de quase 20 anos. Vinte. Anos. Duas décadas se passaram até que eu recebesse o diagnóstico, e até que todas as dores, problemas e riscos que meu corpo correu ao longo deste tempo ganhassem uma cara e um nome: endometriose.

Parece terrível esperar tanto tempo assim para saber o que exatamente está comendo seu corpo por dentro e se infiltrando em órgãos diversos, mas, por incrível que pareça, no universo desta doença que afeta 10 milhões de brasileiras, e, em média, 176 milhões de mulheres no mundo, sou até que uma pessoa de sorte. Há pacientes que passam a vida toda sem conseguir uma resposta nem o tratamento adequado, batendo de porta em porta em consultórios, e encontrando apenas mais dúvidas e indicações duvidosas.

Isso porque ainda são poucos os ginecologistas especializados em endometriose no Brasil – e, os poucos que estão disponíveis são acessíveis a um grupo restrito, já que, em sua grande maioria, não atendem consultas vindas de convênios médicos. Restam, assim, as vias particulares, ou os ambulatórios públicos, que penam com a falta de recursos, limitando e retardando o atendimento de mulheres que, muitas vezes, simplesmente não podem esperar.

No meu caso, por exemplo, esperar realmente foi um luxo ao qual eu nunca pude me dar. A relação entre mim e a endometriose sempre foi intensa e urgente, desde quando, por se manifestar em uma de suas formas mais agressivas, ela decidiu invadir meu aparelho urinário, ameaçando o funcionamento do rim direito, bem como atacar os nervos da minha coluna, e também levar embora, em algumas cirurgias, um de meus ovários e uma trompa.

Sim, a fúria da endometriose não costuma ter limites. Por mais que não seja uma doença maligna, como o câncer, ela se comporta de maneira parecida, com células se espalhando para fora de seu lugar habitual, o endométrio. A doença, aliás, é ainda uma ilustre desconhecida de boa parte da população, que ignora inclusive sua definição.

Endometriose é, basicamente, o crescimento anormal do endométrio, tecido que reveste a camada interna do útero. Em termos práticos, funciona assim: todos os meses, em seu período fértil, o corpo da mulher se prepara para abrigar uma nova vida. Neste processo, os hormônios fazem com que o endométrio fique mais grosso, à espera da fecundação. Quando ela não acontece, ele se descama e sangra – diga “oi” para a menstruação.

No caso de quem tem endometriose, esta camada recobre, também, partes externas do útero, no geral porque o fluxo menstrual não é completamente eliminado, voltando pelas trompas e migrando para lugares indevidos. Os focos – que em sua maioria se encontram nos ovários, mas que também podem ser encontrados no intestino, ureter, bexiga e até mesmo pulmões, em casos mais raros – se inflamam, e causam, com isso, dores que nem mesmo o mais destro médico especialista pode descrever. Só conhece quem sente.

As cólicas menstruais causadas pela endometriose podem ser incapacitantes. Você se lembra daquela colega na escola que tinha dificuldades em participar da aula de educação física sempre que estava menstruada, porque dizia que sentia muita dor? Ela provavelmente tinha endometriose. E a amiga do trabalho, que chega até mesmo a faltar ao emprego ao menos um dia, sempre uma vez por mês? Bingo.

Endometriose não é frescura, tampouco uma doença simples, a ser tratada de maneira inconsequente. A cada ano, novas mulheres sofrerão não só com os incômodos mensais causados por ela, mas também com as altas chances de infertilidade que a doença causa, bem como com seus outros sintomas graves, e que permanecem ocultos por serem considerados irrelevantes, ou porque as pacientes não encontram espaço nos consultórios para relatá-los.

Dor na profundidade da vagina durante o sexo, moça, não é normal. Problemas intestinais, com alternância enlouquecedora entre diarreia e prisão de ventre, também não são coisas desimportantes. Nem são fúteis os sangramentos anais, na urina, ou vaginais que eu sei que às vezes você tem, ou sua retenção de líquido, nem, principalmente, o fato de você conviver com dor contínua, 24 horas por dia.

Portanto, fale. Explique ao seu médico o que você sente, com detalhes e, se possível, longamente. Use sua consulta médica, seja ela paga por você, pelo governo ou por seu convênio, para relatar absolutamente tudo que se passa com seu corpo diariamente, há anos, sem pressa nem vergonha. Nós precisamos falar sobre a endometriose. Nós precisamos debater a doença, para que possamos, cada vez mais, ajudar mais mulheres no mundo a receber o diagnóstico e o tratamento corretos. Nós precisamos mostrar a elas que não precisam conviver com a dor, abrir mão de suas vidas sexuais, muito menos do sonho de ser mães.

Enquanto escrevo este texto, aguardo a autorização do plano para o agendamento da minha sétima cirurgia só neste ano. Como não encontrei um bom especialista coberto pelo convênio, recorri à medicina privada, e só conseguirei arcar com a despesa de dezenas de milhares de reais da intervenção porque, por sorte, minha família se ofereceu para emprestar o dinheiro. Apavorante, sim, mas nada novo para mulheres que já viveram esta etapa, e que já desembolsaram salários, carros e até casas para pagar por sua saúde.

Em minha rotina, há dias em que tenho vontade de sumir, jogar todos os comprimidos receitados pelo médico na privada e fingir que não estou doente nem sinto dor. São dias ruins, em que nem os medicamentos conseguem vencer a dor e o desespero. No entanto, há dias bons como hoje, em que permaneço confiante, boto uma roupa bonita e me arrumo como se fosse sair para algum lugar importante, que não um consultório, hospital ou farmácia.

Estes dias bons acontecem, geralmente, porque, neles, recebi mensagens e telefonemas de incentivo e carinho de pessoas que sabem do meu histórico e do momento que estou atravessando. Chefes, familiares, amigos e amigas que, mesmo sem sentir o que sinto, se solidarizam e se interessam por saber mais a respeito da endometriose e seus efeitos na vida de mulheres como eu, espalhadas por todos os cantos do mundo.

E é isso que desejo imensamente para todas elas: uma rede bem informada de amparo para enfrentar e vencer esta doença que não tem cura, mas tem controle. Desejo que elas tenham acesso a espaços importantes como este aqui, para que joguem luz sobre o problema e busquem, em conjunto com seus médicos, a melhor solução para seus casos. Com conhecimento, certamente tudo isso será possível. Precisamos romper o silêncio. Precisamos falar sobre a endometriose.

]]>
0