Black Friday que adulto gosta mesmo é a Black Friday dos boletos

Marcella Franco

Saiam com essas lingeries para lá, desapareçam com os computadores e celulares, entornem na pia esse bando de uísque e vinho com desconto – não quero mais ouvir falar de Black Friday. Não ao menos enquanto as lojas continuarem diminuindo o preço só das coisas que eu não quero (mentira, quero muito, mas não devo) comprar.

Black Friday que adulto gosta mesmo é Black Friday que dá desconto nos boletos. Black Friday da Eletropaulo, da Comgás, da Sabesp. Ia brilhar os olhos aquele bando de abatimento no valor do condomínio. “O síndico enlouqueceu, tudo pela metade do preço!”, aí a gente ficava feliz à beça, pagava com gosto.

Queria ver estabelecimento agradando as mães e fazendo a Black Friday da renovação de matrícula na escola. A sexta-feira bem louca dos uniformes para o ano que vem, as calças de helanca sem joelheira, prontas para arrombar no segundo mês letivo, agora custando 50% a menos. Imagina o grupo do WhatsApp com a gente tudo enlouquecida, meninas, vocês viram quanto tá a bermuda bailarina, o casaco de tactel?

I have a dream. Black Friday do IPVA em janeiro. Descontos malucos no convênio médico, agora você pode operar no Einstein, veja essa promoção, cirurgia no Sírio pelo preço do SUS! Black Friday de dentista, coroa de porcelana pelo preço de restauração de amálgama. Aí, bicho, não tinha quem não botasse a mão no bolso.

E a Black Friday do Serasa, então, que maravilha? Aquela dívida que a gente vem rolando na expectativa de caducar agora com um baita desconto? Não ia dar gosto já ficar com o nome limpo amanhã, comemora no sabadão?

Mas fica todo mundo fazendo tudo igual todos os anos. Tentando me vender maquiagem, roupa, sapato, essas coisas que eu amo tanto, mas que (afinem os violinos dramáticos) nunca ficam na minha lista de prioridades de proletária.

Será revolucionário o sujeito que olhar nossa fatura do cartão de crédito e se der conta de que ali só tem pepino, só tem emergência, só tem os parcelamentos do para-choque do carro que a gente estourou na pilastra do mercado fazendo compra de mês, as 20 vezes sem juros da máquina tanquinho porque, de tanto lavar roupa na mão, a gente já estava esfolando a carne.

Abram os olhos, comerciantes, não estou cobrando nada pela dica. A Black Friday do essencial. Prometo que não sobra boleto pra contar história.