Trago sua velhice em sete dias

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Marcella Franco

Li em algum lugar que acordar cedo rejuvenesce, devia ser um desses estudos com pouquíssima base científica, mas, ainda que por precaução, o despertador toca às sete todo dia, o que me dá pouco menos de uma hora antes de precisar levantar, mas tempo suficiente para abrir as notícias ainda na cama, além de ler mais alguns estudos sem apoio da ciência enquanto ainda estou deitada e me sentindo jovem e descansada.

Descubro, assim, que uma grande amiga lançou um blog. Tema: envelhecer. A ideia dela, com as postagens, é desmistificar esse processo inevitável, e torná-lo não só menos doloroso, mas, também, um pouco menos desconcertante. Em outras palavras, a Silvia quer que a gente acredite que ficar decrépito está quase na moda, que é uma parada sussa.

Amo minha amiga. Se ela diz que virar uma velha pode não me ser complicado como parece, então tamo junto. Enquanto espero o remédio da tireoide fazer efeito em jejum, dou follow no endereço, ponho o celular para carregar no criado-mudo, e me levanto para preparar o café da manhã com calma.

A calma, aliás, é fundamental para uma pele boa, alguém me disse. Venho tentando ser uma pessoa mais zen, meditar, não xingar ninguém no trânsito, e, sempre que consigo ultrapassar uma situação de estresse sem ser contaminada, corro para a frente do espelho e imagino qual seria a localização do pé-de-galinha que consegui evitar.

Enquanto ferve a água para o chá, é hora dos probióticos. Sou uma adulta madura com problemas intestinais que se arrastam desde a adolescência, e aprendi que tomar um iogurte com microorganismos todo dia pela manhã pode me ajudar a sentir, por exemplo, menos dores de barriga ao longo da semana.

Só que, ao abrir a geladeira e agarrar a embalagem, penso de novo na Silvia, que dia importante, esse, e me vem à cabeça uma postagem que ela fez não há ainda nem uma semana, algo sobre um coquetel de vitaminas e antioxidantes a ser tomado antes da primeira refeição do dia, com a barriga ainda oca.

Parece que essa história de ficar velha e se sentir o máximo ainda não está rolando para mim. Porque, veja se você acompanha o meu raciocínio: há que se tomar, em jejum (vamos fingir que a levotiroxina da tireoide não existiu), o probiótico e o colágeno, mas como se dá esse processo de tomar primeiro um, e tomar também primeiro o outro?

Talvez eu tenha que escolher. Ver aí qual tipo de pessoa prefiro ser: uma velha sem gases, ou uma mulher conservada com problemas no duodeno. Não é justo, eu quero ser os dois. Quero ser todas em uma só, quero ingerir esse monte de comprimidos diariamente e ver resolvidos ao menos alguns dos meus pepinos.

Não faz muito e eu decidi, por exemplo, que não me preocuparia mais com os cabelos brancos, e que os deixaria lá, aqueles cinco fios esparsos, eles não me incomodariam, eu faria o mesmo por eles. E foi bem nesta semana que outros chumaços brancos se viram autorizados a nascer e se desenvolver e, poxa, será que a velhice virá mesmo dessa maneira tirana, sem chance nem escapatória?

Abro de novo o blog da Silvia: nenhuma postagem nova. Ela deve estar ocupada em colher informações para compartilhar com as amigas, quem sabe foi a um congresso para entender quais alimentos deixam jovem e quais nos metem rugas.

Talvez tenha descoberto que o último grito da medicina é passar paletas mexicanas na região dos olhos para evitar os pés de galinha, vai saber, e é freneticamente apertando o F5 no teclado que sinto que preciso fumar um cigarro. Imperativo voltar a ficar zen, vamos entoar um mantra.

Ligo para Silvia, ela demora a atender. Amiga, qual a periodicidade desse seu blog novo aí, aliás, parabéns, me desculpa, que cabeça a minha, como assim uma vez por semana, esses caras do site são loucos? Escuta aqui, Silvia, até segunda-feira que vem eu já envelheci sete dias, você sabe o que isso significa? Perdão, amiga, ok, sucesso para você, seguirei te acompanhando. Alguém sabe onde eu botei o remédio da pressão?