Festival de DR 2020

Pelo telefone, gesticulando bastante enquanto anda pra lá e pra cá, o rapaz negocia com alguém do outro lado da linha a locação de uma casa via plataforma de hospedagem. Fala de detalhes como número de pessoas, data e horário, questiona se prestadores de serviço são aguardados, e menciona as palavras horripilantes: “troca de alianças”.

Ele larga o celular em cima da mesa, satisfeito, e explica que acaba de fechar negócio com um casal que alugou seu sítio por um dia. A quantia é boa. Farão, lá, a cerimônia que compreende entregar um para o outro um anel, e deve tudo acontecer diante de dezenas de convidados, fotógrafos, cinegrafistas. O que antes se chamava jantarzinho de noivado, agora ganha ares de espetáculo.

Sou a única por fora da nova onda. Em uma rápida busca na internet, entendo que se trata de importante tendência, isso de fazer uma festa gigante. Eu, que achava que, no tocante aos matrimônios, havia apenas uma celebração única, me dei conta da minha senioridade. Hoje, parece, in mesmo é comemorar loucamente cada minuto.

Tudo começa com um rendez-vous para pedir alguém em casamento. Lembra quando a ocasião se resumia a uma discreta ajoelhada em um lugar bonito, só nós dois, olha que anel chique eu trouxe nessa caixinha? Esquece.

Hoje é preciso fazer live no Instagram, depois postar stories, daí chamar alguém pra editar e botar música de fundo, e de preferência roteirizar de um jeito que aumente as chances de o pedido viralizar. Torcer pela resposta “aceito” é o de menos.

Chega, então, a tal troca de alianças, com sítio alugado e superprodução. Em seguida, pelo que pesquisei, vêm as provas do vestido, com champanhe e canapés, iates com roupões personalizados ou noitadas com moças de aluguel para dizer tchau ao antigo estado civil, o dia da noiva e do noivo, e, lá nas últimas páginas da agenda, a cerimônia de casamento em si.

De onde essas pessoas tiram tanto fôlego? Animados que são, não demora muito e a noiva engravida. Sempre achei que gestações se resumiam a duas pessoas transando e um bebê nascendo, mas não. Você não imagina o potencial que a junção de gametas tem.

Não há nada mais jacu hoje em dia, dizem, que esperar o nascimento da criança para descobrir seu sexo. Bacana mesmo é fazer um chá de revelação, com balões, bolos e pirotecnia no melhor esquema meninos vestem azul, meninas vestem rosa.

Mais tarde, um chá de bebê, para angariar alguns presentes, daí o fuzuê na maternidade, e então encontros mensais a fim de acender velinhas para a criança a cada 30 dias de vida alcançados. Parabéns, Enzo Gabriel, por ser essa dádiva incessante.

A necessidade de transformar tudo em espetáculo só evidencia a mediocridade da vida de aparências que a gente decidiu levar. Nela, se nada mais é especial, que se faça de tudo uma extravagância.

Rezo pelo dia em que o disparate chegue ao ponto de recebermos em casa os convites para o Sarau de Concepção, o Evento da Primeira Papinha Salgada, a Farra da Traição no Motel, o Festival de DR 2020, e, óbvio, a Solenidade de Divórcio no Cartório Central da Cidade. Com tanta festa boa de casal e neném para ir ao longo do ano, passou da hora de os velórios se reinventarem.