Este texto não vai falar dela
Você sabe o assunto deste texto. Em momentos de indignação generalizada, de perplexidade com a humanidade, acontece mesmo de toda gente opinar. Só que hoje, neste espaço, por estes poucos minutos, o mundo vai ser um lugar normal e justo. De proteção e cuidado. E, por isso, este texto, que é sobre este assunto, vai falar dele sem falar.
Quando nascem, os lobos são cegos, surdos e dependentes. Mamam até a décima semana. A criação de uma ninhada é de responsabilidade não apenas da mãe, mas de toda a comunidade, que colabora, cada um à sua maneira, para a educação dos filhotes. Até os oito meses, eles são ensinados a caçar e a participar do mundo em segurança. Os mais novos nunca são deixados para trás. Um lobo vive em média dez anos.
A Igreja Católica teve um papel fundamental na história da humanidade. Na Idade Média, que durou quase mil anos, o acesso à sabedoria era restrito aos clérigos, porque todos os livros ficavam enclausurados em mosteiros, protegidos por monges copistas. Puderam, assim, os livros, ser preservados e sobreviver à passagem do tempo.
Com capacidade adaptativa impressionante, as pragas podem colonizar praticamente qualquer ambiente, e se reproduzir de maneira vertiginosa. Bibliotecas contemporâneas combatem traças com técnicas que envolvem privação de oxigênio, aplicação de nitrogênio e armadilhas adesivas. Monges, padres ou pastores são inúteis neste e em vários outros processos.
O papel fundamental da Igreja continua, assim, restrito àquele período específico.
O Carandiru foi um presídio na zona norte de São Paulo, inaugurado em 1920 e desativado em 2002. Chegou a abrigar mais de oito mil presos. Por dez anos, o médico Drauzio Varella realizou atendimentos nas dependências da cadeia.
Em seu site, Varella relata que acusados de crimes sexuais cumpriam pena isolados nas celas do último andar do Pavilhão Cinco. Só assim, para mantê-los vivos, explica o médico, a salvo da fúria assassina dos companheiros de cárcere.
As cadeias têm códigos próprios, internos e extraoficiais de conduta. Lá, um homem que violenta alguém nestes termos não merece perdão. A despeito de qualquer esforço da segurança interna, mais cedo ou mais tarde acabará massacrado e morto. Na ótica dos criminosos, cometeu o único delito absurdo, entre tantos que a raça humana é capaz de cometer.
Indivíduos que se desenvolveram em ambientes sem segurança e amor se tornam adultos medrosos. Recorrem frequentemente à imposição e à agressão verbal como defesa, a fim de proteger a imagem que criam de si mesmos, a de seres onipotentes. São, no entanto, incapazes de lutar verdadeiramente por qualquer ideal.
A psicanálise enquadra estas pessoas no espectro megalômano. Fascinadas pelo poder e por si mesmas, entendem que são adoradas como salvadores, líderes a ser seguidos, donas da palavra que vai incitar a todos.
Sarah Domville-Taylor nasceu em 1870, na Inglaterra. Casou-se com Robert Winter em 1890, e anexou ao seu o sobrenome do marido. Depois de ficar viúva, juntou-se à União Britânica Fascista. Ficou famosa por ostentar a bandeira nazista em suas casas. Foi acusada de espionagem, mas nunca sofreu consequências dada a sua proximidade com o rei George VI e Winston Churchill. Sarah Winter morreu em 1944.
Você sabe o assunto deste texto. Porém, não é expondo e opinando sobre a tragédia que tornaremos o mundo um lugar normal e justo. De proteção e cuidado. Por isso, este texto, que é sobre este assunto, fala dele sem falar. Precisamos aprender a nobreza, e praticá-la acima do ego. Não é nem nunca foi sobre nós. É sobre facilitar o anonimato a quem nunca deveria ter sido arracanda dele.