O uniforme que eu posso te dar

Só uma semana de aulas presenciais até agora, e já visitei a loja de uniformes do colégio três vezes. Nada custa menos de R$ 50 lá dentro, o que significa que, além do gasto de tempo para ir até o Pacaembu e voltar, há também o tanto que se tira da carteira a cada passadinha.

Meu filho tem quase 13 anos e cresce cerca de meio metro por hora que fica no sol –à sombra, o ritmo parece mais lento, o que dá algo entre 15 e 20 centímetros no mesmo período de tempo.

É burrice comprar muitas peças de roupa em tempos assim, porque, semana que vem, uma calça servirá apenas como short, camisetas largas virarão babylook, e casacos se tornam boleros roçando o sovaco (agora peludo) em questão de minutos.

Mas, sim, eu visitei a loja três vezes, e nas três vezes consumi itens, toda cega e milionária. É que me dá gosto comprar uniformes para ele.

A vida de mãe solo nunca foi fácil, mas houve momentos ainda mais complicados. Eles coincidiram justamente com a fase em que uma criança pequena suja roupas o dia todo, todos os dias. É porque o suquinho derrama na blusa, é porque foi dia de dar carrinho na quadra na hora do recreio –sempre tem uma explicação boa pra que tudo volte imundo do colégio.

E nem mesmo o luxo que é ter uma máquina de lavar concede privilégios suficientes a quem, às dez da noite, pendura no varal uma roupa que precisa estar enxuta às sete da manhã. Por uma década, sequei muita camiseta na porta do forno, atrás da geladeira, no ferro e com secador de cabelos.

Funciona assim quando não se tem dinheiro para comprar mais de duas camisetinhas e uma calça –nada custa menos de R$ 50, afinal.

Quando nem assim dava pra secar o uniforme, quando não funcionavam nem o forno, a geladeira, o ferro, o secador, Teodoro ia para a escola vestindo um uniforme usado, sem lavar, disfarçado com um spray cheiroso daqueles que ajudam a passar as roupas na tábua.

Era nesses dias que eu tinha certeza de não haver mãe pior que eu no mundo.

Assisti ontem a “Manhãs de Setembro”, série da Amazon Prime que tem Liniker como protagonista. Estreou em junho passado. Chorei de novo, igual chorava escondido naqueles dias passados.

Uma personagem manda o filho escolher: ou vai de uniforme molhado, ou vai de vestido emprestado pra escola, porque não deu tempo de a única camisetinha secar.

Se eu já visitei a loja de uniformes três vezes só na última semana, foi porque, agora que a vida melhorou um pouco à custa de muito trabalho, eu finalmente posso comprar as coisas que sempre quis para o meu filho.

Sinto prazer em trazer a sacola pra casa, dar as peças na mão dele e ver que tudo serve, que está tudo limpo, que há itens suficientes para revezar e higienizar e depois guardar na gaveta.

Já houve um tempo em que torci pra que ele crescesse sem nunca saber que, às vezes, foi pra escola de calça remendada às pressas, de camiseta molhada ou sem lavar. Mas, agora, meu maior desejo é que ele se lembre de todos os detalhes.

Porque, lembrando tudo, ele poderá trocar a memória velha por uma melhor e mais honrosa, e, quem sabe, até ter um pouco de orgulho de mim.